Lutar pelo bem-estar animal

Artigo escrito por Filipa Filipe

Nos últimos anos, temos vindo a assistir a um crescimento das preocupações com o bem-estar animal. Os limites das categorizações foram sofrendo alterações ao longo da História da Humanidade, muito por influência dos contributos da Ciência, como a Biologia, a Etologia, a Psicologia, entre outras. Desde o rompimento com o dualismo cartesiano, as descobertas dos processos cognitivos e da manifestação de sofrimento em animais, passaram a existir novos limites e novas categorias (por exemplo, animais humanos versus animais não-humanos). Um marco interessante nesta evolução, deriva dos trabalhos do “perigoso” filósofo Peter Singer1, geradores de alicerces políticos para a inculcação do movimento pelos direitos dos animais. Este contexto de mudança e inquietude tem vindo a expressar-se sob diversas formas: manifestações e movimentos sociais; constituição de associações, ONG e até de partidos políticos; criação e desenvolvimento de legislação; adopção do vegetarianismo e do veganismo; outras.

Debruçando sobre contexto Português destacam-se a ONG Animal, os partidos PAN (Pessoas, Animais e Natureza) e Bloco de Esquerda, no que à defesa do bem-estar animal diz respeito. A Animal2 existe há 21 anos e luta pela defesa dos direitos fundamentais dos animais não-humanos, através de acções de educação, protestos, denúncias e judiciais. Embora seja uma ONG Portuguesa, devido ao seu trabalho ligado à European Coalition to End Animal Experiments (Coligação Europeia para Acabar com a Experimentação Animal), Rede Internacional Anti-Tauromaquia, Plataforma LA Tortura no Es Cultura, entre outras, tem ganho uma expressão significativa também a nível internacional.

O PAN3, anteriormente denominado por Partido Pelos Animais, afirma emergir num contexto social e civilizacional de mudança, com o objectivo de tornar legal, sob a forma de partido, a sua filosofia própria muito centrada na Natureza e nos Animais. Consideram-se como paradigma alternativo e aceitam as categorias animais humanos e animais não-humanos. Como partido contribuíram para a instauração da lei da criminalização dos maus-tratos aos animais de companhia (Lei n.º 69/2014, de 29 de agosto).

O Bloco de Esquerda, embora seja mais centrado na pessoa e no trabalho, não esquece de todo as questões ecológicas e do bem-estar animal. Sobre este último, pretende reforçar o debate já existente na sociedade e, em especial, alargar as possibilidades legislativas de promoção do bem-estar-animal. Como propostas concretas, deu a conhecer: a eliminação da prática do abate de animais em canis e gatis municipais; campanha de esterilização pública de todos os animais adoptados em canis e gatis; o registo gratuito de cães nas Juntas de Freguesia; o término do financiamento público das touradas; entre outras4.

Acresce que o Grupo Parlamentar do Bloco deu agora um passo em frente na questão do bem-estar animal ao apresentar, no passado dia 9 de Maio, 3 projectos de lei. O primeiro revê o regime sancionatório aplicável aos maus-tratos a animais. Embora, considere fundamental a implementação da lei supra-citada – pelo efeito das 1330 participações que constam no Relatório Anual de Segurança Interna de 2015 – defende a necessidade de algumas alterações, de modo a responder de forma mais adequada às solicitações que a realidade animal implica.

Neste sentido, refere que a lei dos maus-tratos não deverá ser circunscrita a animais de companhia, mas deverá abranger outros animais sencientes, que também convivem com os humanos. Se estiverem confirmados os maus-tratos a animais sencientes, estes devem ser protegidos, sendo por isso retirados temporariamente ao seu detentor legal enquanto decorre o processo jurídico, para evitar repetição de maus-tratos. Devem ser incluídas na legislação, as práticas negligentes, tidas como “naturais” (como por exemplo, deixar um animal confinado a uma varanda) mas que se traduzem na perturbação da etologia do animal. Acresce, por último, o alargamento do prazo de inibição da detenção legal de animais, inicialmente 5 anos, passando a 10 anos de condenação5.

O segundo projecto de lei que altera o Código Civil baseia-se nos princípios da autonomização e da dignificação do animal, desenvolvendo linhas orientadoras para as relações humanos e animais-não humanos. Estes últimos deixam de ser “coisas” para passar a ter o seu próprio estatuto jurídico, do qual, constarão obrigações legais para com os seus detentores legais que garantam o bem-estar animal. Assim, as relações dos humanos para com os animais sencientes não humanos – que percebem o que os rodeia, reagindo de forma consciente a estímulos, como emoções positivas ou negativas – não devem causadoras de sofrimento e morte 6. Por último, com base na Declaração Universal dos Direitos dos Animais assim como no artigo 72º artigo do Código de Trabalho referente a «Protecção da segurança e saúde do menor», o Bloco de Esquerda propõe no seu terceiro projecto de lei o fim da participação de menores de 18 anos em actividades tauromáquicas profissionais ou amadoras, bem como o fim dos matadores de touros 7.

Não obstante, apesar do fortalecimento deste movimento expressivo em Portugal, em prol de uma ética animal e de desapego aos preconceitos do passado, a luta em defesa dos direitos dos animais continua. Até porque vão existindo sempre falhas ou incompletudes a nível legislativo que precisam ser revistas e adaptadas consoante diferentes realidades complexas e mutáveis, de forma a garantir a coexistência do bem-estar animal não-humano e humano.

 

Originalmente publicado no blog A Contradição

Filipa Filipe

 

Filipa Filipe tem 29 anos e é natural do concelho de Alpiarça.

Em 2007 vai estudar para Lisboa, entrando para o ISPA - Instituto de Ciências Psicológicas, Sociais e da Vida para o Mestrado Integrado em Psicologia. 

No mês de Fevereiro em 2008 adere como militante ao Bloco de Esquerda. 

No decorrer de 2010 faz Formação Inicial e Avançada em Psicodrama através do Departamento de Formação Permanente do ISPA. Ingressa no grupo de teatro amador da faculdade dISPArteatro. 

O seu estágio curricular foi realizado na unidade W Mais, pertencente à Santa Casa da Misericórdia de Lisboa.Termina o curso com média final de 15 valores.

No ano de 2013 aceita a oportunidade de fazer seu estágio profissional na Olhar - Associação Pela Prevenção e Apoio à Saúde Mental. Associação essa que pratica psicoterapia a preço social. É no final Novembro de 2014 que termina o estágio na Olhar e se torna Membro Efectivo da Ordem dos Psicólogos Portugueses. Mantém actualmente colaboração com a Olhar.

Em 2015 faz formação em Teatro e Psicologia: Ferramentas em Comunicação pelo Departamento de Formação Permanente do ISPA e faz formação para obter o Certificado em Competências Pedagógicas (CCP) com o intuito de poder dar formação na Área. 

Ainda no decorrer de 2015, passa a dar consultas de psicologia clínica no Lugar de Cura em Rio Maior. Integra também enquanto psicóloga clínica um projecto de Iniciativas em Saúde Pública da ARSLVT com financiamento de fundos comunitários Europeus (EAA Grants) para a promoção da Dieta Mediterrânica nas escolas. Um dos principais objectivos pautou-se por combater as desigualdades nutricionais em 3 agrupamentos de escolas nos municípios de Alpiarça e Santarém. 

O projecto Eat Mediterranean teve a sua conclusão em Abril de 2017 com um seminário na sede do Agrupamento de Escolas Sá Bandeira. 

Actualmente, faz parte da Coordenadora Distrital e da Concelhia do Bloco de Santarém, candidatando-se nestas eleições autárquicas à presidência da Câmara Municipal de Santarém através de uma candidatura de cidadãos e cidadãs independentes com o apoio do Bloco de Esquerda.